Os antigos trabalhadores das empresas Sonangol Investimentos Industriais (SIIND), pertencentes as unidades fabris localizadas na Zona Económica Especial Luanda-Bengo, contradizem a Sonangol, as informações segundo as quais, cumpriu com todos os pressupostos exigidos nos acordos sobre os pagamentos das compensações por rescisão dos contratos de trabalho.
Os trabalhadores denunciam a existência de várias irregularidades no processo, com realce para os descontos do Imposto de Rendimento do Trabalho (IRT) e as contribuições à Segurança Social nas “compensações pagas”, sendo este um dos motivos que vêm, a alguns anos, reivindicar junto ao edifício da petrolífera angolana, exigindo que seja reposta a legalidade.
Numa recente conferência de imprensa convocada pela Sonangol a propósito dos protestos dos ex-trabalhadores, o seu porta-voz, Honorato Troço, disse que com a privatização, em 2019, das unidades industriais na ZEE, foram extintos os postos de trabalho ali existentes e cessados os vínculos laborais com os trabalhadores, com aviso prévio, tendo sido feita a compensação normal e adicional.
Troço considerou ainda, como “actos de arruaça, de aproveitamento” a acção dos ex-trabalhadores, já que algumas dessas manifestações nos últimos tempos, contam a presença de crianças e de um número “elevadíssimo” de portadores de deficiência, que “nunca fizeram parte das organizações para as quais estiveram vinculados”.
Respondendo as acusações do porta-voz da Sonangol, o secretário-geral em exercício do sindicato dos ex-trabalhadores da SIIND, Faustino Zumba, explicou entre outros assuntos, que o Sindicato Democrático dos Trabalhadores Indústria, Comércio e Serviços de Luanda (SINDETRAINDCOSL), representa mais de 1.300 antigos trabalhadores, incluindo integrados no regime de protecção especial como mulheres grávidas e antigos combatentes e veteranos da pátria.
O líder sindical fez questão de mostrar os dados por fábricas dos trabalhadores com deficiência, tendo garantido que a Matelectrica era a fábrica com mais deficientes, os quais haviam sido enquadrados pelo Fundo Lwini e MAPTSS. “Estes trabalhadores também foram descontados o IRT e Segurança Social nas compensações, no âmbito do fim do contrato de trabalho”, esclareceu Zumba sobre o motivo da participação dos mesmos nas manifestações.
O relatório da Sonangol
Fruto das denúncias dos ex-trabalhadores sobre a falta de transparência do processo a várias entidades do Estado como a 10ª comissão da Assembleia Nacional e ao gabinete dos assuntos jurídicos da Casa Civil do Presidente da República, foi possível a Sonangol, em representação a SIIND, enviar junto destes organismos, um relatório que esclarece os pagamentos das “compensações por rescisão do contrato, retroativos salariais e de compensações adicionais”, algo que sempre negou aos reclamantes.
Acontece que os valores que a empresa petrolífera apresenta a Assembleia Nacional, “em termos de compensações”, não são os mesmos que apresenta a Presidência da República.
Conforme documentos em posse do portal MOVi, à 10ª comissão da Assembleia Nacional, a Sonangol justifica que as compensações pagas até a presente data, cifram-se em 4 mil milhões 234 milhões 557.806,00 kwanzas. Ao passo que a Presidência da República alega que foram pagos, as mesmas compensações, o valor de Três mil milhões 832 milhões 426 mil 998,94 kwanzas.
Outras diferenças nos valores
As disparidades nos números dos valores verificam-se igualmente nos pagamentos dos retroactivos salariais. Os dados demonstrativos nos mapas apresentam valores muito inferiores aos pagamentos reais recebidos pelos trabalhadores (ver foto).
Por exemplo, os pagamentos de retroactivos de 2018 da Mateletrica revela que a Sonangol, através da SIIND, pagou a unidade fabril o total de 66 milhões 201 mil 248,88 kwanzas. Esta por sua vez, pagou aos trabalhadores, Cinquenta e cinco milhões 129 mil 458,56 kwanzas, observando-se uma diferença de 11.071.790,32 kwanzas.
Quanto aos retroactivos sobre o IRT, ainda de acordo com o documento que temos vindo citar, a Mateletrica pagou 4 milhões 377 mil 849,00 kwanzas, notando-se uma diferença de 6 milhões 693.941,32 kwanzas. Em relação aos retroactivos sobre Segurança Social, a referida fábrica pagou aos trabalhadores Seis milhões 742 mil 720, 00 kwanzas, deixando transparecer uma diferença de 48 milhões 778,68 kwanzas.
O mesmo acontece às outras unidades fabris nomeadamente a Angotor, BombaÀgua, Galvanang, Indupackage, Indutubos, Pepeline, Telhafal, Transplás e Vedatela, cujo mapa dos retroativos de 2018/2019/2020 e 2021 mostra que a Sonangol teria destinado a SIIND o total de Cinco mil milhões 237 milhões 312 mil 609,00 kwanzas, mas que foi pago aos trabalhadores apenas 2 mil milhões 615 milhões, 416.371,40 kwanzas.
Apelo do sindicato
Perante a falta de clareza do quadro contabilístico, o sindicato considera que o processo está eivado de muitos equívocos, razão porque desde o princípio procurou alertar o Conselho de Administração da Sonangol. A organização diz ainda que as compensações por despedimento não estão sujeitas a tributação do IRT, nem à contribuem para Segurança Social.
Entretanto, ocorre que a Sonangol, por intermédio da SIIND, vem justificando ser legalmente obrigatório os respectivos descontos com base na lei nº 28/20, de 22 de Junho, que sugere que as “compensações por despedimento”, sejam passiveis de tributação em sede do IRT e à Segurança Social. Mas os ex-trabalhadores têm defendido a existência de ilegalidade quanto a esta lei, visto que nos termos dos artigos 6º e 226º da Constituição da República de Angola exclui abertamente a obrigatoriedade tributária e contributiva em sede das compensações por despedimento.
“São ilegais qualquer acto que visem subtrair das compensações vantagens financeiras, económicas ou patrimoniais sob pretexto de alegado cumprimento das disposições da lei 28/20 e do Decreto Presidencial 227/18, de 27 de Setembro, por inexistência absoluta de previsão legal para o efeito”, diz a lei magna que adverte que “tal exigência é ilícita e deve ser rechaçada”.
É assim que o sindicato solicita que seja “corrigido o que está mal” e seja devolvido aos trabalhadores os montantes que foram descontados para o IRT e à Segurança Social, pelo facto de já terem contribuído durante a vigência do contrato de trabalho.
O portal MOVi tentou ouvir a Sonangol após o envio, via WhatsApp ao gabinete de comunicação institucional, uma carta com perguntas para responder ao nosso pedido de contraditório, mas até a data da publicação desta matéria, não recebemos nenhuma resposta por parte da empresa pública.
O portal MOVi garante dar continuidade deste assunto na próxima edição, enquanto aguarda pelos pronunciamentos da Sonangol. Ainda nesta matéria, vamos também destacar um assunto muito pertinente que tem estado a inquietar os ex-trabalhadores, quanto os seus “salário de assegurado”. Conforme os extratos de contas bancarias em posse deste portal de notícias, alguns trabalhadores têm vindo a encontrar de forma recorrente nas suas contas bancárias, operações de valores avultados nas folhas de salário, mas que os pagamentos nunca foram registados.